Chacina de Unaí completa 7 anos sem data para julgamento

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Sete anos depois da chacina que assustou o Noroeste de Minas, a Justiça brasileira ainda não tem previsão de quando será o julgamento dos nove acusados de envolvimento no assassinato de três fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e de um motorista.

Após mais de 30 recursos impetrados ao longo do processo, os advogados de defesa ainda podem acionar o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília, e solicitar o desenrolar do caso na Justiça comum para escapar do júri popular. O último recurso da defesa, com esse mesmo fim, foi negado pelo STJ em dezembro.

No dia 28 de janeiro de 2004, os auditores Nelson José da Silva, João Batista Lages e Erastótenes de Almeida Gonçalves, além do motorista Aílton Pereira de Oliveira, foram assassinados em uma emboscada durante uma fiscalização de rotina em fazendas de Unaí. Os irmãos Antério e Norberto Mânica, fazendeiros que estão entre os maiores produtores de feijão do país, são acusados de planejar o crime. Na época, eles eram fiscalizados por exploração indevida do trabalho, com multas que ultrapassaram R$ 2 milhões.

Sindicalistas querem pressionar pela realização do júri popular em Belo Horizonte e não em Patos de Minas, cidade próxima a Unaí, onde a família Mânica poderia usar de seu poder para influenciar os jurados. Prefeito desde 2004, Antério foi eleito em Unaí quando ainda estava na cadeia. Pela legislação, a inelegibilidade ocorre apenas para quem tem processo transitado em julgado. Em 2008, quando ele foi reeleito, ainda não havia a restrição da Ficha Limpa.

Além de Antério, respondem ao processo em liberdade o irmão Norberto e os empresários Hugo Alves Pimenta e José Alberto de Castro, todos beneficiados por habeas corpus. Os quatro acusados de executar as vítimas estão detidos à espera de decisão da Justiça. São eles Francisco Elder Pinheiro, Erinaldo de Vasconcelos Silva, Rogério Alan Rocha Rios e Willian Gomes de Miranda. Humberto Ribeiro dos Santos teria apagado uma das provas do crime e também está detido desde 2004.

Todos também podem ganhar as ruas a qualquer momento. Na avaliação do conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e advogado criminalista Adilson Rocha, a Justiça Federal não teria mais embasamento para sustentar a detenção por tantos anos sem julgamento. “Há grande chance de o STJ soltá-los. Existe um prazo máximo de 121 dias para manter a prisão, mas, pelo princípio da razoabilidade, pode chegar a um, dois anos, mas sete é demais”.

Para especialistas, as normas jurídicas do país beneficiam quem tem poder econômico e bons advogados à disposição. “É sempre triste e deprimente testemunhar casos de impunidade como esse. É uma manifestação explícita de que no Brasil raramente ricos vão para a cadeia”, diz o coordenador do Instituto Minas Pela Paz, o sociólogo Luis Flávio Sapori. Ele defende reformas na lei processual, com a redução do número de recursos. “O pressuposto uso do direito de defesa se torna um mecanismo de impunidade”.

Adilson Rocha diz que o problema não está na lei, mas na estrutura deficiente. Ele toma como exemplo os dois únicos tribunais de BH que julgam crimes de homicídio. “Temos dois júris, no máximo, por dia, enquanto a cidade registra cinco, seis assassinatos diários”. O conselheiro da OAB defende a contratação de mais juízes, promotores e pessoal de apoio.

Crimes de homicídio podem prescrever se não forem analisados pela Justiça em um prazo de até 20 anos. Porém, conforme interpretação da Justiça, esse prazo pode ser estendido por até 70 anos. “Não acredito que a chacina de Unaí chegue a esse ponto”, afirmou Rocha.

Até o prefeito Antério Mânica se diz insatisfeito com a lentidão da Justiça, embora seus advogados tenham entrado com vários recursos. “Não encontraram nenhum indício da minha participação nesse crime. Estou com a consciência tranquila. Quero ser julgado”.

Para a presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais, Rosângela Rassy, é inadmissível que o julgamento ainda não tenha acontecido. No Pará, lembra, o caso Irmã Dorothy, missionária norte-americana assassinada em 2005 por contrariar interesses de madeireiros, foi a júri em um ano.

Crime provocou insegurança nos auditores fiscais

O presidente da Associação dos Auditores Fiscais do Trabalho de Minas Gerais, João Coelho Frasão de Barros, disse que depois do crime, os fiscais ganharam mais proteção. Desde então, sempre que vão fiscalizar propriedades em áreas rurais do estado são acompanhados por policiais militares ou federais. "Achávamos que o auditor fiscal era imbatível, uma autoridade que impunha respeito, mas depois destas mortes, percebemos que somos frágeis e impotentes frente a esses assassinos".

Além disso, a chacina e sua até então impunidade provocou um desestímulo à categoria. Frasão afirmou que muitos fiscais se sentem angustiados e amedrontados por exercer tal função, temendo serem as próximas vítimas. "Nos sentimos desamparados vendo um crime tão bárbaro e cruel ainda sem conclusão. Nossa categoria não é mais a mesma".

Viúva diz que só terá paz com o julgamento

Viúva do auditor fiscal Nelson José da Silva, morto aos 52 anos, a comerciante Helba Soares da Silva, de 47, disse que acorda todos os dias pensando no crime, que até hoje não a deixa em paz. "Sinto que eu ainda não enterrei meu marido. Minha vida tem sido buscar punição para os assassinos. E só poderei descansar no dia em que os culpados forem julgados e condenados. Rezo para que isso aconteça o mais rápido possível. Já não aguento mais essa demora".

Helba é a única das quatro viúvas da chacina que ainda vive em Unaí, Noroeste de Minas. As outras mudaram-se para Belo Horizonte. Por causa disso, ela ainda paga o preço de não poder andar livremente pela cidade, cujo prefeito, Antério Mânica, é um dos nove acusados pelo crime. "Não tenho a liberdade de ir em qualquer lugar nesta cidade. Logo após o crime, quando me encontrava com ele, eu o xingava. Mas o melhor é não encontrá-lo".

Pelas ruas da cidade, Helba conta que ainda são feitos muitos comentários sobre a chacina. "Nesses sete anos, o pessoal da cidade abriu muito a boca, o que gerou novas provas, novas testemunhas, pessoas que viram os acusados no dia do crime, fortalecendo a acusação. Pelo menos para isso, essa demora serviu", desabafou.

Colaboração: Igor Guimarães e Carolina Coutinho – Hoje em Dia

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