Uma “conversa atravessada” em um restaurante foi o bastante para se iniciar uma investigação que colocou a Câmara Municipal de Paracatu no alvo do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e deu início a uma longa operação denominada “Templo de Ceres” nos últimos anos. Ao todo, dos 17 vereadores, 14 foram denunciados por desvio de verbas de gabinetes e, até agora, cinco vereadores já foram condenados.
Em entrevista na última semana, a promotora Mariana Duarte Leão, que conduziu as investigações, contou que um morador ouviu um assessor parlamentar pedindo uma nota fiscal em um restaurante para colocar como gasto de verba parlamentar. Isso teria ocorrido no começo de 2016.
O morador que ouviu essa conversa achou a prática incomum e acionou o Ministério Público. Ao analisar os gastos dos vereadores, Mariana Duarte começou a perceber que havia algo estranho.
“Comecei a dar uma olhada nas despesas e a primeira coisa que chamou atenção foi a locação dos veículos. Na época não existia uma locadora de veículos na cidade. Aí comecei a consultar a placa e nenhuma das placas estabelecia que era para locação. Descobrimos que havia carros usados simultaneamente, que o valor das diárias oscilavam. Tinha gente que locava o carro o mês inteiro. Apresentava nota fiscal de manutenção de veículo locado, o que é um absurdo”, explicou a promotora.
Mariana contou que os próprios vereadores, dentro da legislatura de 2013 a 2016, aumentaram o valor da verba de gabinete. Saltou de R$ 4.500 por mês para R$ 8 mil. O valor serve para ressarcir gastos dos parlamentares como diárias de viagens, alimentação, material de escritório, entre outros. No entanto, esse valor era desviado através de notas fiscais fraudulentas.
Após o início das investigações, Mariana explicou que a Câmara Municipal de Paracatu acabou com as verbas de gabinete. “Isso estancou a sangria. Hoje em dia, o material gráfico é fornecido pela própria Câmara. Tem prevista uma diária, em caso de viagem, e tem motorista próprio e carro próprio da Câmara que pode ser usado em viagem oficial”, explicou a promotora.
Ao todo, incluindo vereadores, assessores e comerciantes, cerca de 60 pessoas foram investigadas e denunciadas. No caso dos vereadores, cada denúncia foi apresentada de forma separada, por isso alguns foram condenados e outros aguardam a decisão da Justiça.
Segundo Mariana, entre R$ 1 milhão e R$ 2 milhões foram desviados dos cofres públicos somente com verbas de gabinete. Para a promotora, essa investigação, que mostrou como funcionava esse esquema dentro da Câmara, mostra a força da sociedade civil na fiscalização do Poder Público.
“Vejo com esperança, pois foi através da sociedade civil que veio a investigação. De certa forma, vejo que o país está evoluindo, as pessoas vendo o que os políticos estão fazendo, para que possamos fazer nosso trabalho e garantir uma sociedade mais correta”, finalizou Mariana.