Que a cocada é, sem sombra de dúvidas, uma das sobremesas mais apreciadas no dia a dia, isto não é nenhuma novidade. O segredo, talvez e muito certamente, está no modo de fazer do prazeroso doce, cuja receita teria surgido na Bahia (rica na produção de coco!), graças ao conhecimento e ao labor dos negros escravizados, que o preparavam para os seus senhores e para si. Há quem sustente, entretanto, que a cocada seja de origem africana.
Artigo publicado em 2022 no site do Centro Universitário Tiradentes (UNIT) afirma que “o doce era preparado pelas escravas para ser consumido pelos próprios escravos durante à noite, quando se reuniam para dançar, como uma maneira de esquecer o sofrimento por alguns momentos”. É bem provável que aí esteja parte da explicação quanto à preferência pela sobremesa à base de coco e açúcar, que, ao ser degustada, produz uma momentânea sensação de prazer ou algo parecido.
A doce iguaria guardaria estreita relação com a formação histórica do município de Paracatu, haja vista que por aqui a escravidão também deixou suas marcas e como tal, a culinária de origem africana esteve e está presente na cultura local, de forma a revelar a riqueza e a pluralidade de suas tradições. Exemplo disto seria o bolo desmamada, adotado por aqui como uma quitanda paracatuense, que teria sua origem em uma receita africana, já que as escravas preparavam-na para desmamar os filhos de suas senhoras, revelam alguns estudiosos da cidade.
Diante desse gigantesco “tacho” que reúne saberes, fazeres e delícias, ainda há quem sob o sol causticante do cerrado mineiro e montado numa modesta bicicleta cargueira, equipada com um generoso tabuleiro cheio de cocadas e quebra-queixos vistosos, pedale com “gosto” para vender não só a sua deliciosa sobremesa, mas também momentos recheados de doçura e alegria: É o Sr. Benedito Mauro, de 47 anos de idade, quem encanta seus fregueses com sua mistura de coco, açúcar, água (do coco), leite condensado e dedicação.
Paracatuense e morador do bairro Alto do Açude, o senhor Benedito é dos poucos – senão o único!? – que na cidade polo do Noroeste de Minas, faz e comercializa ainda o saboroso quebra-queixo, cuja receita foi posta em prática por ele com o incentivo e o auxílio da senhora sua Tia, Dona Maria Isabel, de aproximados 60 anos de idade. Ele se orgulha de contar que a primeira bicicleta que utilizou para vender os doces era emprestada e que criou seus 3 filhos com a renda desse saboroso ofício.
A cocada e o quebra-queixo do Senhor Benedito, e de outros doceiros aqui residentes, deveriam constar dos catálogos de quitandas tradicionais da culinária local, pois são quitandas que, por certo, estiveram presentes no cotidiano do nefasto passado escravagista vivenciado pelos negros em Paracatu, que dentre outras contribuições, deixaram saborosas receitas, que formam um rico patrimônio imaterial do município.
(*) Carlos Lima é graduado em Arquivologia pela Universidade Federal da Bahia (UFBa), é Pós-Graduado em Oracle, Java e Gerência de Projeto e é pesquisador da história e da cultura de Paracatu e publica seus artigos neste site e no Jornal O Lábaro.
REFERÊNCIA
CENTRO UNIVERSITÁRIO TIRADENTES (UNIT). Cocada: Conheça a história do doce. Disponível em: < https://pe.unit.br/blog/noticias/cocada-conheca-a-historia-do-doce/#:~:text=seu%20sabor%20marcante.-,Acredita%2Dse%20que%20ela%20tenha%20surgido%20em%20meados%20do%20s%C3%A9culo,o%20sofrimento%20por%20alguns%20momentos. >. Acesso em: 27 Ago. 2023.
Agradecimentos ao Sr. Benedito Mauro pelo seu depoimento e pela cessão de sua imagem para ilustrar este artigo.
ROSSI, Mariane. Cocada é um dos doces brasileiros mais populares e surgiu na Bahia;. Disponível em: < https://g1.globo.com/sp/santos-regiao/culinaria-013/noticia/2022/10/14/cocada-e-um-dos-doces-brasileiros-mais-populares-e-surgiu-na-bahia-aprenda.ghtml > . Acesso em: 28 Ago. 2023.