A farmácia de René Girard é remédio para a alma

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Tarzan Leão nasceu em Ipueira-RN, e já fez de tudo para sobreviver: redator de rádio, repórter e editor de TV, professor, produtor musical e cantador. É ex-dominicano, bacharel em filosofia pelo CES-UFMG e membro da Academia de Letras do Noroeste de Minas. Escreveu Aboios e A nau (poesias); Contos de amor e desamor; os romances Pânico na Rua da Bahia, De volta à infância perdida, Nem todos serão felizes, Verás que um filho teu não foge à luta e Proezas de Biròzim, que provocou uma polêmica literária sem precedentes em Paracatu, onde mora com a mulher e seus dois filhos. Assina uma coluna semanal no jornal Dinâmico e contribui para diversos jornais e sites.

Jornal O Lábaro – Quando surgiu a idéia do livro?
Tarzan – A ideia surgiu em julho de 2009, quando vi um pequeno ensaio que escrevi publicado no Paracatu.net. Na ocasião, acertei com o Glauber Cesar de semanalmente postar um texto inédito e, ao fim de um ano, reuni-los em livro. Foi assim que nasceu a “Farmácia de René Girard”. Evidentemente, a partir do momento em que decidi publicar em livro, fui produzindo os artigos de modo a formarem um todo orgânico, entrelaçados e ao mesmo tempo independentes entre si.

Jornal O Lábaro – Qual é a novidade desta nova obra?
Penso que a maior novidade é porque se trata do meu primeiro livro de não-ficção. É um Tarzan diferente daquele que o leitor encontra em “Aboios”, “Proezas de Biròzim” e nos “Contos proibidos”. Nessas obras que citei, é possível encontrar um autor despojado, preocupado apenas em divertir, fazer uma arte que se justifica pelo prazer da leitura, voltada, às vezes, para o drama, mas também para o humor. Na Farmácia sou mais reflexivo, preocupado em desvendar determinadas nuanças da cultura humana, ou, como costumo dizer, buscar o que está escondido, o que está por trás de nossas ações. É, por isto mesmo, um livro de caráter mais filosófico e também de forte pendor teológico.

Jornal O Lábaro – O Livro “A Farmácia de René Girard” é baseado em que?
Todo o meu pensamento hoje é fortemente influenciado pela teoria do desejo mimético, desenvolvida pelo antropólogo e crítico literário francês René Girard, de quem tomo o nome emprestado para dar título ao meu livro. Ou seja, os 52 textos que estão no livro são inspirados no pensamento de Girard. Assim, mesmo quando faço ficção, o desejo mimético está ali presente, ainda que de maneira velada. Os meus “Contos proibidos” são todos influenciados também pelo pensamento girardiano, que é uma maneira fantástica e lúcida de ver o mundo e a humanidade. Há cerca de vinte anos fui apresentado ao pensamento de René Girard pelo teólogo inglês James Alison, talvez a maior autoridade no assunto hoje em dia. Mas, acabei adiando esse encontro com a obra de Girard para quase 17 anos depois. O livro é o resultado das minhas reflexões recentes. E sou, muito embora informalmente, um difusor do pensamento de Girard e da sua obra, hoje em grande parte disponível já em língua portuguesa.

Jornal O Lábaro – O Senhor encontrou dificuldades para a publicação do livro?
É sempre muito complicada a publicação de um livro, principalmente para autores ainda desconhecidos no eixo Rio-São Paulo, como é o meu caso. Tenho outros livros publicados, mas todos eles ficaram circunscritos a uma área muito pequena. Este último, busquei uma editora de São Paulo, a All Print Editora, que tem um eficiente sistema de distribuição através da venda pela internet e por outras grandes livrarias do país. Foi uma negociação relativamente longa, até a assinatura do contrato e a publicação do livro. Felizmente deu tudo certo, o livro está com uma excelente aceitação, e, para a nossa alegria, vendendo muito bem. Isso é bom não só pra mim, mas também pra Paracatu. Embora nordestino de nascimento, a minha literatura é fortemente marcada pela cultura mineira e, sobretudo, paracatuense. Assim, aonde a “Farmácia de René Girard” chegar, Paracatu vai junto também.

Jornal O Lábaro – A literatura utiliza mentiras para dizer a verdade?
Usa. É claro que usa. Mas, isso quando se trata de não-ficção: poesia, conto, romance, teatro… Só que não é mentira no sentido lato do termo, eu substituiria mentira por fantasia. Quando escrevo os meus contos, romances ou novelas, construo histórias inventadas, mas que sempre dizem uma verdade. Os “Contos proibidos” estão cheios disso. Não é o caso, por exemplo, da Farmácia. Por se tratar de uma obra de caráter científico, a busca da verdade ali é uma constante. Aí não pode haver vacilo algum. Tenho sempre de procurar, por meio de um raciocínio lógico, comprovar as minhas teses. Quando faço ficção é diferente. A obra de ficção não precisa ser coerente. Aliás, na obra de ficção nem preciso concordar com o que fazem ou pensam os meus personagens. Já a obra de não-ficção, no caso “A farmácia de René Girard”, é uma espécie de credo: tudo o que escrevo ali é porque acredito. Quer saber o que eu penso sobre religião, Deus, sociedade, amor? Leia este livro e você descobrirá.

Jornal O Lábaro – O senhor é um leitor que escreve livros? Ou é mais escritor que leitor?
Sou bem dividido neste requisito. Aliás, é meio que um círculo vicioso: leio muito porque sou escritor e escrevo porque sou um ávido leitor. Os meus melhores momentos de lazer são quando estou lendo ou escrevendo. Escrever, embora seja um trabalho árduo, difícil, pode também ser bastante divertido. Já li de tudo nessa vida. Hoje estou mais criterioso, e cada vez mais me voltando para os clássicos: Shakespeare, Dostoievski, Machade de Assis… Isso, na ficção. Em filosofia, Emmanuel Levinas, o próprio Girard, Foucault, Derrida.

Jornal O Lábaro – Uma das discussões atuais sustenta que o romance está esgotado, que se deveriam buscar novas formas, algo híbrido em que entram a autobiografia, a reflexão, o ensaio. O que o senhor pensa disso?
Concordo, mas em termos. O meu último romance, “Verás que um filho teu não foge à luta”, usa e abusa desse recurso. Nele, além de uma história ficcional, o leitor vai encontrar muito de história contemporânea: Golpe de 64, as greves do ABC paulista no final da década de 1970 e a ascensão de Lula ao poder. Vários outros autores usam também este recurso literário. Eu citaria aqui Elder Macedo, Vargas Llosa, Antônio Torres, Jorge Semprum, Pedro Juan Gutierrez, dentre outros. Penso que o leitor se sente hoje muito atraído por esse tipo de literatura. Ele se vê inserido no universo ficcional. Gosto de confundir ficção e realidade. Mas, afinal, o que é de fato a realidade? Bom, se alguém me fizesse essa pergunta eu responderia que a realidade pode ser aquilo que eu vejo e experimento. E que pode ser bem diferente daquilo que você experimenta e enxerga. Ou seja, a realidade é múltipla. Minha ficção está sempre impregnada de realidade.

Jornal O Lábaro – O sentimento de pertencer a um mundo à parte faz bem ou mal aos escritores?
Bom… não sei se pertencemos a um mundo à parte. Mas, o ato de escrever em si, é muito solitário. Não sou do tipo de escritor que precise de silêncio, de estar isolado do mundo para escrever. Quando falo que é um ato solitário é no sentido muito mais metafísico do que no plano físico propriamente dito. Tenho de me abstrair da realidade, do mundo que me cerca e buscar, dentro de mim, essa força criativa que me faz escrever, criar universos paralelos, mundos, gentes, pessoas com sentimentos, desejos, vontades. Pessoas que, de fato, passam a existir de verdade. Converso com os meus personagens, busco perscrutar o seu mundo de afetos. E para fazer esse exercício, é preciso solidão e paz interior. Tenho de estar bem, calmo e centrado naquilo que busco escrever. Senão o texto não sai bom.

Jornal O Lábaro – O que perdemos quando passamos do livro em papel para o e-book?
Primeiro, é bom que se diga, o livro não vai acabar; acredito que sempre haverá espaço para o livro tradicional, impresso em papel, etc., não vejo perda nessa passagem para o e-book. Vejo ganho. Vai facilitar o acesso, o transporte e a guarda dos livros. Estou louco que o iPad tenha preços mais acessíveis no mercado brasileiro para eu adquirir o meu. Alguns temem, no entanto, que a pirataria se estenda agora para os livros. Eu iria ver isso até como um bom sinal… significaria que o povo estava começando a ler, coisa rara em nós, brasileiros. Agora, é claro, o livro tem aquela magia, aquele cheiro próprio; o gosto de ver os livros nas estantes, enfim. Eu, pessoalmente, não terei dificuldade alguma de adaptação. Procuro viver o meu tempo, e o meu tempo se chama hoje.

Jornal O Lábaro – Gostaria de deixar uma mensagem aos paracatuenses?
Na verdade eu quero apenas agradecer. Graças a Deus, o povo de Paracatu tem acolhido muito bem os meus textos, sejam eles de ficção ou de não-ficção. E isso é um privilégio para poucos! Hoje, na cidade, acredito que “A farmácia de René Girard” perde em vendas apenas para “Ágape”, do padre Marcelo Rossi. Agora veja a estrutura de divulgação do padre Rossi e olhe a minha! Mas, para isso acontecer, além de um bom texto, tive o apoio de todos os meios de comunicação da cidade. Dilsinho da TVP e Humberto Neiva da Boa Vista FM – isso para não citar os jornais da cidade, seus concorrentes…rsrsr – deram um apoio decisivo para que o meu novo livro ficasse tão conhecido assim. Ando nas ruas e as pessoas comuns querem saber detalhes da obra, pedem explicação sobre René Girard e sua teoria do desejo mimético. Então eu nesse momento só tenho a agradecer aos paracatuenses pelo apoio e dizer: comprem o livro! Ele é muito bom e edifica.
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