“Tirava um dedo de prosa com um irmão-amigo”… Desde sempre o ser humano está à procura de felicidade e de sentido. O Homem “quer ser feliz mesmo vivendo de tal modo que não o seja” – Santo Agostinho. Essa observação expressa a tensão entre o desejo profundo do ser humano e as suas opções morais mais ou menos conscientes. “Se o homem não é feito para Deus, por que é feliz somente em Deus? Se o homem é feito para Deus, por que se revela tão oposto a Deus?” – Pascal. Não é possível deixar de notar a atualidade deste pensamento.
Fiquei matutando… Na era da globalização, observa-se, em nossa sociedade, uma rápida transformação nas escolhas éticas, promovida pelo choque das informações “on line”, pela complexidade das relações sociais e dos progressos da ciência e pelo desenvolvimento de novas tecnologias, especialmente no campo da psicologia, da genética e das comunicações. Tudo isso exerce uma influência profunda sobre a consciência moral de muitas pessoas e grupos, desenvolvendo uma cultura fundada sobre o relativismo, a tolerância e a abertura às novidades, sem fundamentos suficientes, filosóficos e teológicos. Para um bom número de cristãos católicos essa cultura da tolerância tem como fruto a crescente recusa e fechamento a certos aspectos do ensinamento moral da Igreja solidamente radicados na Escritura.
“Ser criatura de Deus, ter recebido tudo da parte de Deus, ser essencialmente e intimamente um dom de Deus, isso é o dado fundamental da existência humana e, portanto também do agir humano. Essa relação com Deus não se acrescenta como elemento secundário e transitório à existência humana, mas constitui-se como seu fundamento permanente e insubstituível” – Pontifícia Comissão Bíblica.
Esta é a razão pela qual o homem não pode viver sem considerar a vontade de Deus; deve descobrir e respeitar as características e estruturas que o Criador concedeu à sua criatura. Assim a moral é muito mais que um código de comportamentos e atitudes, apresenta-se como um “caminho” revelado, dom de Deus, um valor presenteado para nossa realização e felicidade. No sentido bíblico, esse “caminho” deve ser concebido segundo o seu sentido teológico profundo: ele designa a Lei como um dom de Deus, como fruto da iniciativa exclusiva de um Deus soberano que se empenha a si mesmo numa aliança que engaja o ser humano numa relação com Ele.
No seu teor original, o Decálogo reflete uma ética fundamental e rica, tornando-se o fundamento insubstituível de uma moral necessária ao nosso tempo. Seu alcance é universal, pois os valores por eles promovidos podem ser aplicados a toda a humanidade de todas as regiões e de todos os períodos da história e ainda, os Dez Mandamentos, de fato, abrem o caminho a uma moral de libertação social podendo servir como base para um ensino moral adaptado às necessidades da humanidade de hoje.
O Decálogo abre o caminho a uma moral libertadora: (1) o primeiro lugar é da soberania de Deus sobre o mundo; (2 e 3) dá a cada um a possibilidade de ter tempo para Deus e de administrar o próprio tempo de modo construtivo; (4) favorece o espaço de vida da família; (5) preserva a vida, mesmo enferma e aparentemente não produtiva, das decisões arbitrárias do sistema e das manipulações sutis da opinião pública; (6) neutraliza os elementos de divisão que tornam frágil a vida matrimonial; (7 a 10) detém todas as formas de exploração do corpo, do coração e do pensamento; protege a pessoa contra os ataques à reputação e contra todas as formas de engano, de manipulação, de abuso e de coação.
Infelizmente, em muitos ambientes desenvolve-se há algum tempo uma espécie de alergia contra toda forma de proibição: todas as proibições são interpretadas, mesmo se de modo equivocado, como limites e amarras da liberdade. Este tipo de comportamento fez com que os Mandamentos fossem esvaziados de seu sentido orientador e sendo abandonado seu ensino, inclusive na catequese moderna.