31 de março: abaixo a Democracia e as Diretas Já! Viva a ditadura! Pelo retorno dos milicos ao poder! Dá para acreditar?

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          31 de março de 1964. Exatos 51 anos atrás, um golpe militar de direita, apoiado pela elite conservadora nacional e pelos Estados Unidos, golpeou mortalmente a democracia brasileira. Destituiu o presidente João Goulart, fechou o Congresso Nacional, censurou a imprensa, prendeu, torturou, baniu e matou muitos daqueles que resistiram. Trouxe ordem e até algum progresso, vá lá, como o discutível “milagre econômico” do ex-ministro Delfim Netto, mas a que custo? A ditadura imposta e só garantida pela truculência dos milicos, com seus fuzis e canhões mirando o coração da Pátria, durou cerca de 20 anos, uma longa noite de horror, quando o clamor democrático deitou por terra o regime ditatorial ilegítimo.

          31 de março de 2015. A Democracia está viva, anos após o povo ir às ruas exigir as Diretas Já.  Menos de três meses depois da posse de um governo eleito  pela soberana maioria do eleitorado brasileiro, as ruas estão lotadas. Os derrotados e descontentes com o resultado das últimas eleições presidenciais livres estão alvoroçados. E são reforçados nos protestos por significativa parcela popular, convencida pela grande mídia sabidamente parcial, e até mesmo por parte dos arrependidos da opção que fizeram poucos meses atrás. Pedem que seja dado o dito pelo não dito ou o fim de um governo legitimamente eleito. Dentre os manifestantes, pasme-se, muitos clamam pelo retorno da sanguinária e assassina ditadura e dos opressores militares e seus adeptos ao poder.

          Peço perdão ao internauta e confesso que, neste ponto, sou parcial, não podendo concordar com os defensores do golpe e do retorno dos milicos.  O pensamento voa até a juventude, quando era um jovem repórter do O Jornal de Montes Claros.   O periódico tivera um desentendimento com um censor da ditadura, que olhava as matérias antes da sua publicação e decidia se as mesmas podiam chegar ao público ou não. Quando o então ex-presidente João Goulart morreu exilado no Uruguai, o censor quis que o veículo desse a notícia, porém, dizendo ter morrido o ex-presidente “agitador e comunista”, com o que o jornal não concordou, alegando poder o censor, por força das normas de exceção, impedir a publicação de um texto, mas não determinar como teria que ser o seu conteúdo.       

          Anos antes, um jovem estudante secundarista de nome Eduardo Lima, que viria a ser contista, cronista e poeta, funcionário da nascente Rede Globo Minas e um dos maiores homens de rádio que já conheci, com passagem pelas grandes emissoras de Belo Horizonte, fora preso e torturado. Simplesmente porque, quase menino ainda, no jornalzinho do grêmio escolar, escrevera um poema em que denunciava a fome e o frio e dissera: “rasgue a Bandeira Nacional e faça roupa para os seus filhos”. Foi demais para os milicos.  O comunicador, meu amigo pessoal, que morreu poucos anos atrás, teve seus direitos políticos cassados e enfrentou forte trauma por muito tempo, em consequência da tortura. Isso era comum e não havia a quem recorrer, pois os direitos e garantias individuais haviam sido suspensos.

          Jovem repórter e militando na política estudantil universitária, fui eleito diretor de Arte e Cultura do Diretório Central dos Estudantes Universitários de Montes Claros, juntamente com Reginauro Silva, um gênio do jornalismo que deve estar fazendo lindas reportagens no céu. Jornalistas e militantes na política estudantil, éramos muito visados e recebíamos telefonemas ameaçadores. Um tenente do Exército foi transferido de outra cidade para a nossa sala e um policial militar, que era da P2, a polícia secreta, também vivia de olho em nós que, na verdade, não passávamos de dois jovens universitários interioranos, cheios de sonhos e ideais patrióticos singelos.

          Fomos várias vezes “convidados” para almoçar no restaurante dos oficiais com o comandante do 55º Batalhão do Exército. Era um convite educado, mas também uma mal disfarçada intimidação.  No meio do almoço, lá vinha pressão. Engolir como?   A situação só melhorou um pouco quando o presidente Ernesto Geisel demitiu o general Silvio Frota, o poderoso ministro do Exército que queria dar um golpe de estado e endurecer o regime.  Com ele, caiu também o comandante do Batalhão que nos sacaneava, um frotista roxo.

          Então, me perdoem, mas, por esses e vários outros motivos, que são de amplo conhecimento,   aceitar golpes, golpistas e o retorno dos milicos, como se diz por aqui, “é meio muito”…
 
Do Toco do Pecado – Comentários de Florival Ferreira

 

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